PROSTITUIÇAO INFANTIL

                PROSTITUIÇÃO INFANTIL
  O Brasil: corrupção, desvio de verbas, enriquecimento ilícito, impunição. A sutil e quase imperceptível erosão cotidiana da consciência humana. O homem exterminador do próprio homem. Arraigados na crença judaico-cristã de céu e inferno, do bem e do mal, lançamos nossas responsabilidades ao imaginário e ela se dissipa, como a cobrança que só será efetuada quando a dívida não mais existir. Ao se falar que a criança representa o futuro da humanidade, corremos o risco de cair no vazio dos jargões decorados, mas pouco entendidos e visivelmente ineficazes. Contudo, essa é uma verdade absoluta. O que será da nossa civilização, em um futuro tão próximo que basta "dobrar a esquina", se estamos corrompendo, se estamos destruindo aqueles que amanhã serão os principais atuantes da nossa sociedade? Sabemos da existência do "porno-turismo" na região Nordeste e da exploração de crianças nas áreas de garimpo do Norte do País. É difícil até imaginar crianças de seis anos sendo exploradas sexualmente e, para nosso assombro, chegou-se a mencionar que cerca de 50 mil meninas estão sendo prostituídas no Brasil, cifra que coloca o nosso País em segundo lugar no mundo, superado apenas pela Tailândia.



Sabe-se que a prostituição infantil não é um fenômeno exclusivo da civilização moderna. Mas o grande alerta e maior assombro é como ela está se manifestando e em que escala. No Brasil, ela se mostra de forma explícita nas ruas de cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Fortaleza, Recife. Em Brasília a prostituição infantil não é tão incidente quanto nas outras cidades, mas é um problema que já começa a preocupar.

Lançada em Brasília, a Campanha Nacional pelo Fim da Exploração, Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes e do Turismo Sexual tem conseguido, extraordinariamente, mobilizar vários setores da sociedade, representantes do Judiciário e do Legislativo como as Deputadas Fátima Pelaes e Marilu Guimarães – Presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a apurar responsabilidade pela exploração e prostituição infanto-juvenil –, o GDF com o programa SOS Criança, ONGS, o Movimento Nacional de Meninas e Meninos de Rua, e muitos outros. Somente o programa SOS Criança, que trabalha com a denúncia, por telefone (1407), de qualquer situação de risco que envolva crianças e adolescentes, registrou 39 denúncias em um período de 28 dias. O fato é que o movimento já gerou as primeiras conseqüências, como, por exemplo, o fechamento da boate Queen’s, na 315 Norte, após várias denúncias de prostituição de menores no local. Mas sabemos que o problema não está nem perto de acabar por aí. Estima-se que cerca de 40 crianças, entre 9 e 16 anos, estão se prostituindo nas ruas da capital. Detectados e até mapeados, os principais pontos de prostituição infantil são visitados a qualquer hora do dia por dezenas de homens novos, velhos, casados, solteiros. A "ponte", como chamam as meninas, ou seja, o viaduto da rodoviária, bem no coração de Brasília, é um dos principais, mas há muitos outros, como a 115 Norte, CONIC, Setor Bancário Norte, Guará, Planaltina e tantos outros.

FILHAS DA NOITE – Elas andam em bandos e dormem nas ruas. Arredias, ariscas, desconfiadas, agressivas. Se chegarmos um pouco mais perto, veremos uma outra realidade. Uma carência que não cabe no corpinho franzino de algumas delas e uma total falta de compreensão do peso real do que fazem. Sem a mínima maturidade sexual ou emocional, elas não têm capacidade para avaliar e muito menos optar se realmente querem ser prostitutas.

Mas nada é certo ou exato. Não podemos homogeneizar essas crianças e traçar um perfil ou montar um quadro com características rígidas. Após o contato com várias meninas, pudemos constatar que muitas delas fazem parte de uma segunda geração de pessoas que já viviam na rua, ou seja, filhos de filhos da rua. Por aí já podemos entender que o problema é bem anterior e mais profundo do que podemos imaginar.

A desestrutura da família é um dos únicos fatores constantes. Muitas dessas meninas já sofreram algum tipo de violência ou abuso sexual vindo de sua própria família e acabam fugindo para as ruas. Outras vêm de Goiás e do Nordeste para a capital, em busca de trabalho, não conseguem e a família não sabe como ganham aquele "dinheirinho" que mandam todo mês. Outras, ainda, são incentivadas pela própria família a se prostituírem. Ao ganharem a rua, com o passar do tempo, perdem os vínculos com a casa e com a família, seduzidas pelos atrativos da rua. A liberdade, a falta de limites e obrigações, o cheiro da cola e do thinner, o cigarro de merla (pasta de coca).

A primeira pergunta que se faz: o que leva uma criança a se prostituir ou ser prostituída? Em primeiríssimo lugar a miséria. Em todos os sentidos. Ao perguntarmos, a resposta poderia ser dada em coro: por dinheiro. Dinheiro para comprar comida, sim, mas principalmente para comprar cola. Logo que chegam às ruas, as meninas experimentam a droga, muitas vezes oferecida pela "turma". Viciadas, elas roubam e se prostituem para comprar mais e, se não tiver, thinner ou até mesmo esmalte. Na maioria das vezes tem sempre uma cafetina ou um cafetão por trás delas. Eles descobrem um ponto e começam a agenciar, muitas vezes trazem as meninas de longe ou das cidades satélites. Eles administram o negócio, mantêm as meninas dependentes e as protegem ao mesmo tempo.

"Prostituição: vender o corpo para o prazer de outras pessoas. A prostituição só é crime quando uma pessoa: convence, induz ou atrai alguém a praticar ato sexual com outras pessoas; impede que alguém saia da prostituição; tem lucro ou é sustentado com a prostituição de outra pessoa; mantém casa de prostituição. Pena: reclusão de 1 a 10 anos e multa. A prostituição não é crime para a pessoa que se prostitui por vontade própria."

(Código Penal, arts. 227 a 230)



A indústria do sexo-turismo



Estado de alerta: em todo o Brasil, crescem os casos de exploração de menores, através da condenável indústria do pornô-turismo



Há exatamente 10 anos, foi realizado no Recife o primeiro flagrante policial da prostituição de menores, a partir do que as autoridades estaduais começaram a admitir a existência desta forma de violência contra a criança e o adolescente na cidade. No dia 26 de maio de 1987, a jovem titular da Delegacia de Costumes, Olga Câmara, iniciando na carreira, foi fazer uma blitz noturna na beira-mar do bairro de Boa Viagem, o de maior renda per capita da capital pernambucana, disposta a começar uma ação que sabia ser o começo de uma enorme batalha. Flagrou um "turista" suíço induzindo meninas pobres de 13, 14 anos de idade – que saem das favelas locais e de outras cidades e perambulam pela praia passando fome e se prostituindo – a acompanhá-lo ao hotel e a aceitarem ir embora para a Suíça, sob promessas de vida melhor.

Ele – que foi expulso do País – era a ponta de uma rede européia de exploração de menores atuando no Nordeste brasileiro, conta a delegada, que hoje é a titular da Diretoria de Polícia da Criança e do Adolescente (DPCA) e, como tal, membro da Rede Estadual de Combate ao Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes. Tanto a DPCA como a Rede surgiram a partir de um trabalho de sensibilização em todo o Estado, aproveitando o choque sentido pela cidade com o flagrante de Boa Viagem, supracitado, e também com a revelação de que o Recife é o eixo regional da exploração sexual de menores e se transformou num centro do chamado sexo-turismo.

Para a ação contra esse crime, a Rede – da qual fazem parte 7 ONGs e 7 entidades do Estado, incluídos aí representantes do Ministério Público – se debate com a falta de estatísticas locais e nacionais. Mas, a paisagem social e da prostituição de menores são tão presentes que a urgência das ações se impõe. Criada há dois anos, com base em experiências na Bahia – informa a delegada – a Rede constatou que, de cada 100 meninas prostituídas no Recife ("elas não são prostitutas, são prostituídas" – avisam seus integrantes) cerca de 35 procedem de Natal (RN), 25 de Campina Grande (PB), 20 de Maceió (AL) e somente 20 de Pernambuco. Quer dizer, Recife é o receptáculo regional.

Dos 214 inquéritos instaurados em 1996 na DPCA, 112 tinham relação com sexo. "A exploração sexual de crianças e adolescentes é incrementada pela facilidade com que se entra em Pernambuco pelo Aeroporto Internacional dos Guararapes. É aí que tudo começa. Os agentes da exploração já estão esperando os estrangeiros para levá-los aos hotéis especializados" – diz Olga Câmara, para quem a repressão a isso deve começar pelo rigor na triagem de turistas que chegam, "principalmente de homens vindos da Alemanha". Silvino José do Nascimento Neto, membro da Rede, diretor do Centro de Articulação Retome Sua Vida e presidente do Conselho Estadual da Criança e do Adolescente, informa que a partir dos dados das investigações e repressão nos últimos anos constatou-se que é a partir desse país e da Suíça que a rede internacional do sexo-turismo atua. Nos últimos dois anos, a DPCA investigou os vôos charter vindos da Alemanha. Em diversos deles, chamou a atenção o "baixo nível social e o pouco dinheiro dos visitantes", contam Olga e Silvino. A investigação revelou que esses vôos desembarcavam os agentes do sexo-turismo. Com a ajuda do consulado alemão e de entidades alemãs que atuam no Brasil na proteção do menor, foi feita uma denúncia desses vôos ao Governo germânico no final de 96. Este ano, os aviões do sexo-turismo rarearam no Recife.

"Você precisava ver como eram as festas de despedida dos agentes quando encerravam uma temporada no Recife. Era festa no aeroporto com meninas de 13, 14 anos de idade, choro de despedida e tudo!" – admira-se a delegada, que vê as medidas repressivas ainda "pequenas diante do que existe de exploração". Mas, a ação contra os vôos do sexo produziram logo um efeito na praia: carente de clientes, a boate Chakatak, que servia de ponto de encontro de adolescentes com alemães em Boa Viagem, diminuiu o movimento, graças também à ajuda do consulado alemão. Mas, continua aberta e luminosa, inclusive com cardápio e placar da liga de futebol do país de Beckembauer, tudo em alemão.

O presidente do Conselho Estadual informa que a ação desta entidade atinge hoje 50% dos municípios pernambucanos, mas o objetivo é a criação de conselhos municipais, porque o problema da agressão ao menor tem marcadas nuances locais que diferem do Recife. "Em Belém do São Francisco, por exemplo, é comum meninas de 11 anos de idade já grávidas. Ao longo do tempo, vamos descentralizando as ações, mesmo porque a ação do Conselho e da Rede no município é mais visível, assistindo os meninos que estão pela rua. Através do Conselho, o município assume seus meninos de rua. Senão, eles vêm para o Recife". Na capital, podem ser também vitimados pelo comércio da pedofilia, como já foi constatado: meninos de 9 e 10 anos de idade sendo seduzidos a embarcar, com agentes, para a Suíça. O Conselho está ligado diretamente ao gabinete do governador do Estado. A Rede, por sua vez, foi inspirada por um projeto da Usaid (iniciativa dos Companheiros da América) e tem apoio tecno-financeiro da Unicef.


Estados onde o problema é mais grave

Rio de Janeiro: cerca de mil meninas de rua entre 8 e 15 anos de idade se prostituem, segundo dados do Centro Brasileiro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente.

Pernambuco: uma em cada três prostitutas de Recife tem menos de 18 anos.

Paraíba: Dados da CPI federal sobre prostituição infantil e juvenil em João Pessoa: 175 meninas e 75 meninos de rua se prostituem, muitos deles de 5 a 7 anos de idade.

Rio Grande do Norte: 61% das meninas de rua entre 12 e 14 anos (90% delas não usam preservativos).

Bahia: em Salvador, a faixa de idade fica entre 12 e 17 anos. Pesquisa com 74 prostitutas dessa faixa revelou que a maior parte teve a sua primeira relação sexual aos 10 anos. 80% delas são negras, pobres e analfabetas.



MINISTÉRIO PÚBLICO EXIGE MAIS AÇÃO



O que o Governo deve fazer para minimizar a grave questão do sexo turismo


Na área da Justiça, há no Recife a preocupação do Ministério Público diante do que vê como falta de políticas governamentais em face às causas da violência contra menores. O Procurador de Justiça do MP e vice-Presidente da Associação Brasileira de Magistrados e Promotores de Justiça da Infância e da Juventude, Romero Andrade, manifesta isso, assim como um dos maiores penalistas do País, Romualdo Marques, e a coordenadora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Infância e da Juventude, Janeide Oliveira de Lima, que atua há 11 anos no MP.

Em entrevista à CONSULEX no Recife, deixaram entrever que, do ponto de vista jurídico, nem tudo é consenso diante desta forma de violência que é a exploração sexual. Todavia, são unânimes em que, com o surgimento de novas modalidades do comércio do sexo, o Código Penal vigente, que data de 1942, está superado. Seguem-se seus pontos de vista:


Revista CONSULEX – A Constituição Federal (art. 227), reza que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito a saúde, alimentação, educação, lazer, profissionalização, cultura, dignidade, respeito, liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de pô-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e pressão. Como conciliar a letra da Carta com a triste realidade vivida pelo País, em especial no Nordeste brasileiro, relativamente à prostituição infantil?

Romualdo Marques – É evidente que são inconciliáveis. Seria necessário que o Estado cumprisse as prestações positivas que estão previstas na Carta, mas que não são efetivamente implantadas. É grande a distância entre as disposições constitucionais e a realidade do País. A própria família deve ser auto-estruturável, incumbindo-se de satisfazer essas necessidades. O Governo deve emprestar prioridade a tudo que diga respeito às gerações futuras.

Janeide Oliveira de Lima – O que vejo é o que todo o Brasil vê: um problema endêmico. Em 93, a Deputada Benedita da Silva pediu uma CPI. Concluiu-se que não podemos quantificar o fenômeno no Brasil. Não havia estatísticas. Até hoje, não temos esses dados. Conclui-se pelo óbvio: que há mais meninas que meninos prostituídas. A CPI notou que a prostituição muitas vezes começa na família, com a criança perdendo toda noção de respeito humano. Nada discrepa do que temos em Pernambuco. Aqui e no Norte a prostituição é mais cruel, com o explorador ficando com 80% da renda das meninas. A menor decapitada no Pará pelo explorador, para servir de exemplo, em 1993, é um caso emblemático.

Romero Andrade – Essa é uma preocupação também dos demais Estados. Envolve a falta de execução de políticas públicas no município, no Estado e na União. No NE, ressalte-se também o aspecto econômico. Infelizmente, até com a cumplicidade do Governo, lato sensu, quando atrai turistas usando até propaganda de apelo sexual. Acho que a lei, por si só, tende a não resolver o problema. Falta vontade política para se implantar o que diz a legislação. O exemplo que deve ser tomado é o dos Conselhos Municipais e seu fortalecimento através dos governantes. Os Conselhos têm por fim elaborar políticas de atendimento à criança e ao adolescente. Supletivamente, cabe capacitar e sensibilizar os atores aplicadores da lei – magistrados, polícias e MP.

CONSULEX – O Código Penal brasileiro tipifica objetivamente a lascívia como crime, quando praticada por maior de 14 anos e menor de 18 (art. 227, inc. I). Poderia esclarecer, para o leitor leigo, a noção exata desse tipo penal e explicitar quais são suas figuras qualificadas?

Romualdo – Nosso legislador diz, no art. 227, caput, que é proibida a interferência de terceiros, quanto à vida sexual de maiores de idade. O que não se admite é um terceiro atrair, fazer a "corretagem" com o fim de satisfação sexual. Ninguém pode servir de intermediário. Aí se tipifica a lascívia. O CP de 1942 é extremamente rigoroso nas limitações da prática sexual. A sanção é rigorosa no crime sexual contra maiores de 14 e menores de 18 anos.

Janeide – No parágrafo primeiro, há uma irrealidade, porque fala em maior de 14 e menor de 18. Hoje, isso não tem sentido, porque não se pode concluir que não haja exploração de menores, ainda que com menos de 14 anos. Hoje, a pedofilia está ostensiva. Veja a cena do leilão do hímen de uma menina na novela A Indomada, da Rede Globo. É a apologia do crime contra o menor. Quanto à lascívia, praticada contra menor de 14 e 18, o crime passa a ter tratamento especial. Se com emprego da coação, a pena passa a ser de 2 a 8 anos. Mas o capítulo todo está defasado pelo que eu já mencionei.

Romero – (Endossou a resposta da Promotora Janeide, sem acréscimos).

CONSULEX – Quando a lei fala em induzir alguém à prática da prostituição, a conduta deve visar a quem? Para que haja induzimento, é necessário que tenham sido feitas promessas, dádivas, súplicas?

Romualdo – Induzir é uma forma de convencer. É interferir na autodeterminação das pessoas. Isso no art. 228. Aí já não é para satisfazer lascívia de outrem. Qualquer pessoa de qualquer sexo e qualquer idade está sujeita a ser vítima deste delito. Seja como for, existe a indução.

Janeide – A legislação não faz diferença. Sempre há induzimento, com ou sem lucro. Se for com lucro, a pena associa-se a uma multa. Cabe à doutrina estabelecer o que é induzimento. Na minha opinião, dependendo da resistência da vítima, haverá ou não induzimento. Algumas correntes dizem que é preciso dádivas ou súplicas, mas, enfim, não guardam uma subjetividade da vítima?

Romero – A indução pode incluir vários objetivos. Na prática, o que se observa é a indução por galanteios, atração material, tais como presentes. Por exemplo: no Juizado, apareciam meninos com roupas de seda, sapatos de cromo alemão, muitos eram até matriculados em academia de ginástica.

CONSULEX – Consabido que o vocábulo prostituição encerra comércio habitual do próprio corpo para a satisfação sexual de determinado número de pessoas, o favorecimento desse crime se aplica também a quem induz menores do sexo masculino a se prostituir?

Romualdo – Sim. Nosso legislador, ao tratar a respeito, disse: "Induzir ou atrair alguém à prostituição...". Quanto à prostituição masculina, não há dúvida. O legislador resolveu amparar os menores. Dada a possibilidade de não-resistência da criança, esses delitos são considerados não como induzimento, mas como violência sexual. Isso chama-se violência presumida, nos casos em que a vítima não é maior de 14 anos.

Janeide – A questão engloba o homem e a mulher. Sim, o favorecimento também diz respeito à vítima do sexo masculino.

Romero – Pelo Código Penal, o homem não é sujeito passivo, vítima da prostituição e atos libidinosos. Nossa preocupação, manifestada em conversa com o deputado Federal Sílvio Pessoa (PSDB-PE) e falando pelo Centro de Apoio às Promotorias da Infância e Juventude, é que ele apresente na Câmara uma proposta de projeto para alterar o Código Penal, substituindo a expressão "mulher" por "qualquer pessoa". A proposta foi aceita pelo deputado, tendo o mesmo encaminhado à comissão competente.

CONSULEX – No que concerne ao favorecimento da prostituição, a lei não requer especial finalidade do agente para tais comportamentos. Isso significa que bastaria apenas o fim de lucro para o agente incidir na tipificação do § 3º do art. 228, do CP?

Romualdo – Não bastaria. O fim do lucro é uma das possibilidades de ocorrência desse crime. O lucro é uma das possibilidades para a prática do delito, que importará num acréscimo de pena através da aplicação de multa.

Janeide – Posso induzir alguém à prostituição sem ter por finalidade auferir lucro para mim. Mas, posso convencê-la de que, se ela se prostituir, terá uma vida melhor. No momento em que favoreço é porque quero lucrar com isso, incido no § 3º, onde a sanção se associa a uma pena de multa.

Romero – Sim, porque a visão do legislador é a de que esse tipo de ilícito visa exatamente a satisfação do agente ativo e à satisfação do passivo, no que se refere ao aspecto econômico ou alguma vantagem material.

CONSULEX – O encaminhamento de mulheres a prostíbulo, ainda que elas já tenham tido experiência sexual, caracteriza favorecimento da prostituição?

Romualdo – Pode caracterizar, se isso for forma de facilitar a prostituição. Independente da experiência sexual da pessoa, há favorecimento da prostituição.

Janeide – Caracteriza. Não importa a experiência sexual. Há a possibilidade de a pessoa largar a prostituição. Mas, se persuado a que se cristalize esta situação de prostituição, independente da experiência sexual da vítima, ajudo a perenizar o estado de prostituição.

CONSULEX – Os motéis podem ser qualificados, juridicamente, como casas de prostituição?

Romualdo – Sim. Pela letra do CP, sim. O art. 220 diz: "Manter lugar destinado a fins libidinosos..." Se tenho um local para encontros rápidos que, presumivelmente, é usado para encontros sexuais, então o local é caracterizado como tal. Mas, grande parte das decisões judiciais foi por absolver os motéis. O juiz se predispõe à absolvição com base em que o Estado não faz sua parte, isto é, não faz a repressão. No caso de proibir, nosso legislador não foi por aí. É como na Lei Seca dos Estados Unidos: proibir não adianta. Todo dono de motel paga impostos, e por isso o Estado tolera.

Janeide – Dentro da objetividade jurídica, o motel se caracteriza como casa de prostituição. Nelson Hungria dizia (Comentários ao Código Penal, vol. 8, págs. 278 e 279) que se inclui como casa de prostituição. Além de conventilhos, alcoices e lupanares, os "hotéis de cômodos à hora".

Romero – Na minha visão, não. Porque, em sua própria concepção, em tese, não significa albergar casais, no sentido jurídico. A maioria dos motéis aqui foi construída com dinheiro público, e até acho engraçado, porque poderiam muito bem ser chamados de hotéis, e não motéis.

CONSULEX – Com relação à figura do rufianismo, o consentimento da vítima tem relevância para a tipificacão do crime de prostituição?

Romualdo – Não. O rufianismo (art. 230 do CP) só ocorre quando há consentimento. A não ser que seja qualificado como ato de violência.

Janeide – Não. Porque a prostituição é livre, a pessoa pode dispor do próprio corpo. Mas, ninguém pode explorar a prostituição alheia.

Romero – Entendo que sim, no caso específico de crianças e adolescentes. O consentimento não tem relevância devido a inúmeras maneiras de indução usados pelo rufião.

CONSULEX – Mulher que vive às custas de amantes determinados podem ser consideradas como prostitutas?

Romualdo – Não. Grande parte das esposas vivem às custas dos maridos. Prostituta é aquela que oferece o corpo por dinheiro.

Janeide – Isso é muito subjetivo. Aí entra muito a liberdade da mulher. Cada uma tem liberdade para dispor do próprio corpo. Não quero entrar nessa questão, porque acabaria ingressando no terreno moral, profundamente subjetivo.

Romero – Pessoalmente, não entendo assim, porque o contato mais estreito e permanente determina vínculo mais de sentimento do que a visão do lucro. Temos também que observar que, neste contexto, há um grande número de relações conjugais fora do patrimônio fixo. Não é justo que se defina a questão como prostituição.

CONSULEX – Como punir o estrangeiro turista que aqui vem apenas para explorar menores e prostituí-los, em face do nosso Código Penal? A lei brasileira prevê punibilidade em casos tais?

Romualdo – No Código Penal brasileiro, o estrangeiro é tratado como os da terra. Se for explorar sexualmente a menores, responderá como se cometesse violência.

Janeide – Punição exatamente pelas letras do CP brasileiro. O estrangeiro pode ser enquadrado no art. 213 por estupro, se tiver relações com menina de 12 anos, mesmo com o consentimento dela.

Romero – Há países que, pelo menos oficialmente, como a Alemanha, que têm legislação específica para punir seus cidadãos em qualquer lugar do mundo. O estrangeiro, não tendo as imunidades diplomáticas, é alcançado.




A experiência da Casa de Passagem

A mais recente pesquisa sobre crianças e adolescentes de rua, submetidos à exploração ou prestes a isso, foi realizada em 1991 e 1992 pelo Centro Brasileiro da Criança e do Adolescente – Casa de Passagem, no Recife, só com meninas e com apoio da Save the Children. Contaram 1.015 meninas (53% dos 6 aos 16 anos). A ocorrência de prostituição entre elas se elevava a 45%. Essa pesquisa serviu para a Casa de Passagem iniciar seu trabalho que, segundo sua Diretora, Ana Vasconcelos, faz a defesa social e individual de meninas e adolescentes mulheres que vivem nas ruas.

"A filosofia do projeto é a abordagem psico-sócio-educativa, trabalhando com as meninas para seu fortalecimento individual e grupal, dando chance a que experimentem relações humanas mais construtivas" – diz a Diretora. Para isso é feito contato direto escutando a história de vida de cada uma, estimulando a fala e o valor pessoal, "quebrando o circuito de silêncio entre as mulheres pobres". Por esse caminho, a Casa de Passagem está sendo a mais bem sucedida reação contra a exploração de menores. Atua em 11 comunidades pobres, tem sede central dentro de uma delas. De 94 para cá, chegou a 200 mil atendimentos.

"Aqui tomo banho, dou banho no meu filho, tem psicólogo, refeição. Se essa casa fechar, vai ser o fim do mundo" – diz Maria Cláudia, 16 anos. Para isso há o apoio da cooperação internacional e parcerias com o Programa Criança Cidadã do Governo Federal. "Trabalhamos com quem o Estado não se interessa. Não se sabe como esse projeto vai sobreviver, mas não desistimos", diz a Diretora, antevendo que os apoios não são eternos. A Casa distribuiu nos últimos meses 30 mil folhetos sobre Aids e 50 mil camisinhas. O drama das meninas de rua é encenado pelo chamado Teatro da Saúde, da Casa, na peça O Bolero de Rachel, tendo as meninas como atrizes. A peça já foi assistida por 150 mil pessoas.

A adolescente Rute, 16 anos, hoje na Casa de Passagem, conta: "Eu tava dormindo muito drogada de Rupinol. Aí, a pessoa quando toma Rupinol pode fazer tudo que quiser que não sente nada. Aí um homem tirou minha roupa, fez o que quis comigo. Quando eu acordei, tava toda melada de sangue. Era de madrugada. Eu tinha 12 anos."


Legislação ultrapassada

Promotora de Justiça cobra atualização do Código Penal no que se refere ao tráfico de homens para prostituição



O nosso Código Penal, promulgado em 7 de dezembro de 1940, inspirado nos costumes do final do século XIX e acontecimentos do início do século XX, só dispôs a respeito do tráfico de mulheres, e não de homens. Isso é o que afirma a Promotora de Justiça e Diretora do Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Infância e da Juventude, Janeide Oliveira de Lima, que tem pregado a necessidade de atualização do CP no sentido de abranger as novas formas de delito que têm surgido nas últimas décadas. Ela se refere, mais especificamente, ao tráfico de homens para o exterior a fim de se prostituírem.

Quando redigido, há 60 anos, nota a Promotora, "o nosso legislador nem de longe poderia imaginar que meninos e adolescentes homens fossem vitimizados pela violência do tráfico do sexo, coisa que ocorria só com as mulheres porque eram, como se dizia, do sexo frágil". Hoje, entretanto, a realidade é outra, que faria o legislador dos anos 40 cair de costas.

A preocupação da Diretora do Centro de Apoio Operacional nessa direção se acentuou quando procurada pela Rádio CBN, no início do ano. A reportagem a informou que o correspondente da emissora, na Suíça, descobriu um grupo de pessoas que estavam promovendo a saída, do Brasil para aquele país, de garotos entre 10 e 11 anos de idade, procedentes de diversos estados da Federação, a fim de se prostituírem, "principalmente com pessoas do sexo masculino", assinala Janeide.

O correspondente da rádio constatou, in loco, que a denúncia correspondia aos fatos. Fingiu-se de cliente do tráfico e pediu a companhia de alguns garotos brasileiros. O empregado da casa de prostituição, que fica em Berna, capital suíça, atendeu prontamente, permitindo o flagrante por parte da reportagem. Para Janeide, ficou a pergunta: quais as sanções previstas no CP para um caso como este? A resposta, até agora, é: nenhuma.

Decadência – A Diretora do Centro de Apoio abre o Código Penal à altura do título VI (crimes contra os costumes) e se convence que o texto precisa, urgentemente, "acompanhar o ritmo da atualidade dos fatos". E acrescenta: "É indiscutível a distância que atualmente se verifica entre as formas de exploração da prostituição alheia e os tipos penais construídos pelo legislador de 1940. Para se perceber a defasagem, basta ver as expressões utilizadas pelo legislador. Muitas delas pouco ou nada dizem a respeito das maneiras de prostituição e dos modos de se tirar partido da prostituição alheia nos moldes atuais. As figuras clássicas dos exploradores de mulheres, que chamavam tanto a atenção do legislador de 1940, e as expressões utilizadas pela doutrina penal suscitam, atualmente, um bolor, uma decadência". Ela se refere a termos antigos como "lenocínio", "casa de recurso", "lupanar" e outras em desuso. Assim como é ultrapassado o conceito de que somente mulher é sujeito passivo no delito de tráfico.

O episódio suíço, segundo a Promotora, indica o prejuízo resultante do descompasso do CP que, em seu art. 231, dispõe: "Promover ou facilitar a entrada, no território nacional, de mulher que nele venha a exercer a prostituição, ou saída de mulher que vá exercê-la no estrangeiro". Quer dizer, só se refere a mulheres. Sendo assim, os traficantes não estão cometendo ilícito quando estão traficando garotos, e não garotas. A propósito, a Diretora do Centro de Apoio cita Heleno Fragoso (Lições de Direito Penal, vol. I, Forense, 9ª edição, pág. 159): "A ilicitude penal só pode existir se corresponder a determinada figura de delito, que esgota e limita, nos extremos da definição legal, a conduta punível".

Diante disto, o que resta fazer para coibir o tráfico de homens?

"Resta às autoridades perseguir a existência da associação de traficantes por meio da conduta delituosa prevista no art. 228 do Código Penal, que prevê o crime de favorecimento da prostituição" – afirma a promotora, limitando-se ao atual texto do CP. "O ideal – acrescenta – seria a existência de uma regra que contivesse o elemento masculino também como sujeito passivo do tráfico para a prostituição. Como não há tal previsão legal, o conflito de normas se resolve aplicando-se a mais específica, que sobrepuja a de caráter geral".

Janeide refere-se à aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente, que coíbe a saída indiscriminada de crianças para o exterior por meio da adoção irregular. Na urgência de o País ter como impedir esse tráfico, o art. 245 do CP acabou sendo atropelado pelo art. 239 daquele Estatuto, que trata do envio de filho menor para o exterior com o fim de obter lucro. Ela lembra o cotejo feito pelo Professor Celso Dalmato (Código Penal Comentado, 3ª edição, pág. 392) entre estes dois artigos. Dalmato diz: "Tráfico internacional de menores: compete à Justiça Estadual, por não haver o Brasil ratificado qualquer tratado ou convenção internacional a respeito".

A Diretora do Centro de Apoio conclui, diante disto, que a desatualização da lei penal quanto à repressão da prostituição de menores "prejudica até mesmo a Campanha Nacional pelo Fim da Exploração, Violência e Turismo Sexual contra Crianças e Adolescentes, já que o caso concreto trazido a propósito evidencia a necessidade da criação de novos tipos penais que acompanhem a realidade".


O Outro Lado da Moeda

Lilian Gomes dos Santos, Lili, filha de doméstica e policial militar, entrou para o mundo do sexo-turismo aos 14 anos de idade, na praia de Boa Viagem. Para isso, usou documentos falsos arranjados por um suíço. Há dois anos está na Alemanha, sendo explorada por um cafetão. Grávida, veio visitar a família, mas foi para ter a criança e deixá-la com os avós. Na ocasião a família tentou segurá-la no Recife, mas ela se envolveu de novo com "os gringos" na praia e voltou para a Alemanha. Thomaz, a criança, vive com a avó de Lili. Hoje, ela está com 18 anos de idade e envia cartas para a família falando em casamento. Telefona para a família dizendo que está tudo bem e que está trabalhando como garçonete em Hamburgo. A família não acredita.dita.

                                                   

Reportagem Sérgio Augusto Silveira











MINHA OPINIÃO:







   NAO DA PARA DISCUTIR MUITO SOBRE O ASSUNTO POIS ESTE É UM TEMA POLÊMICO E QUE TEMOS QUE ANALISAR VARIOS FATORES,CUJO ESSES SAO POLITICOS,GEOGRAFICOS,EDUCACIONAIS ENFIM GERANDO UMA SERIE DE OPINIÃO DIVERSAS,MAS IREI DAR APENAS UM PEQUENO RESUMO DO QUE PENSO,EM MEU VER O ESTADO TEM ENORME PARCELA DE CULPA.O ART.227 QUE RETRATA QUE O ESTADO E A FAMILIA TEM DEVER DE CUIDAR DAS CRIANÇAS E DOS ADOLESCENTES,MAS DEVEMOS ANALISAR QUE MUITAS VEZES A FAMILIA TEM PARCELA DE CULPA,UMA DELAS É QUANDO A MAE PERMITE O PAI OU PADRASTO ABUSAR DE SEU FILHO OU FILHA POIS A MAE PENSA SE EU NAO DEIXAR O "FULANO" FAZER ISSO ELE IRA ME ABANDONAR OU QUANDO A PROPRIA MAE OU FAMILIA VENDE SEU FILHO E FILHA PARA TER DINHEIRO PARA SE SUSTENTAR,MAS  A QUESTAO DA PROSTITUIÇÃO É QUE BOA PARTE DE MENINOS E MENINAS SE VENDEM POR DINHEIRO,PARA TEREM DINHEIRO PARA SE ALIMENTAR OU SUSTENTAR SEU VÍCIO E QUANTO A ISSO O ESTADO É INTEIRAMENTE RESPONSAVEL POIS ENQUANTO O GOVERNO TANTO FEDERAL E ESTADUAL INVESTIR DE MILHOES A BILHOES DE REAIS EM OBRAS DE CRESCIMENTO COM FINS DE CAMPANHA POLITICA ESQUECE DE INVESTIR EM EDUCACAO,SAUDE E ALIMENTAÇÃO,ESQUECE DE INVESTIR EM TRATAMENTOS COM DEPENDENTES QUIMICOS,ESQUECE DE TIRAR CRIANÇAS E ADOLESCENTES DAS RUAS,DOS SUBMUNDOS DA PRONSTITUICAO E TAMBEM DO TRAFICO DE ENTORPECENTES



            QUANTO AO MEU VER NO LADO ESPIRITUAL É QUE ALEM DE FALTA DE OPORTUNIDADES E BASES FAMILIARES TEM  A QUESTAO DE FALTA DE APOIO E EQUILIBRIO ESPIRITUAL DA FAMILIA PARA COM A CRIANCA E TAMBEM A QUESTAO QUE A CADA DIA QUE PASSA AS FAMILIAS SE DESINTEGRAM,VALORES MORAIS ESTAO SENDO ESCASSOS,RESPEITO DE SER HUMANO PARA SEU PROXIMO E ALGO RARO,SAO POUCAS PESSOAS QUE SENTEM AMOR FRATERNO E RESPEITA SEU PROXIMO



                        É TUDO QUESTAO DE CONJUNTO QUE ENVOLVE FATORES POLÍTICOS, GEOGRÁFICOS, ÉTICOS,MORAIS E ESPIRITUAIS



                            DEVEMOS NOS UNIR E QUANDO FIZERMOS NOSSAS PRECES,ORACOES EMANAR SENTIMENTOS POSITIVOS PARA ESSAS CRIANÇAS,PEDINDO A DEUS QUE REESTRUTURE AS FAMILIAS,A SOCIEDADE,REGENERE ESSAS CRIANÇAS E ZELE PELO FUTURO DELAS,JA QUE AS MESMAS NAO PODEM CONTAR COM O ESTADO,A SOCIEDADE E A FAMILIA,SO RESTA ESPERAR PELA "PROVIDENCIA DIVINA" 









1 comentários:

  1. Não há coisa que eu mais odeie nessa vida que um monstro pedófilo. Me dá ânsia de vômito tudo que faça apologia à abuso infantil. Some da face da terra pelo amor de Deus, e que ele tenha misericórdia da sua alma, e que ele cuide dessas almas inocentes.

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Tenha um dia abençoado e que as bênçãos de Deus sejam sempre frequentes em sua vida! Amém.

 
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